Já tenho feito
aqui e ali no blog críticas a filmes, o que não é de todo o meu forte. Revi
este filme muito recentemente, e ao início partilhei num grupo de Whatsup uma
crítica escrita em inglês sobre o Colorful, em substituição de um hipotético
artigo meu. Mas após refletir e rever de novo este magnifico filme, as ideias
vieram, e como aspirante a escritor que sou, em momentos como este é sempre boa
política pegar no lápis ou no computador e escrever o que nos ocorre.
Começo por dizer
que a animação japonesa é atirada para um certo “gueto”, muitas vezes
injustamente. Houve uma fase da minha vida que consumia imenso, pois tem
gêneros e conteúdo para todas as idades, desde as famosas histórias de heróis e
sobrenatural até aos chamados “slice of life”, que é a categoria onde Colorful
se integra.
O filme é focado
no adolescente Kobayashi Makoto, que tentou suicidar-se com uma overdose de
comprimidos. O primeiro impacto do filme é marcante, quando observamos a cama
do hospital ao ver o jovem Makoto acamado, os pais desolados a pensar que
perderam o filho, e o irmão mais velho, virado para a parede a dar lhe um soco.
Makoto, a quem é dada uma segunda chance na vida, sobrevive e aos poucos vamos
aprendendo com o adolescente o contexto da sua vida – ao inicio, retrata uma
família feliz, uma casa confortável, uma mãe atenciosa, um pai de bom coração e
o irmão academicamente evoluído, mas pouco a pouco vamos acompanhando o que se
passou: o pai ausente, focado em demasia o trabalho, a mãe que Makoto viu a
trair o pai com o instrutor de flamengo e o irmão mais velho a quem Makoto
parece-lhe indiferente, não fazendo esforço de criar relação com ele.
O filme torna-se
neste momento pesado: descobrimos que Makoto não tem amigos, é vítima de
bullying na escola, tem dificuldades nas aulas e o seu único e grande talento é
para o desenho. Neste ponto é interessante constatar a visão de adolescente e a
sua relação com a saúde mental: Makoto, como é característico dos adolescentes
(e de muitos adultos) tem uma visão estrita e altamente moralista do mundo, e
as premissas que se apresentam na sua vida são desoladoras, e aos poucos
começamos a sentir o desconforto que Makoto sente consigo mesmo; ao mesmo
tempo, sentimos o desconforto que Makoto causa à sua família, cujos esforços de
criar uma nova relação com ele parecem ser sempre boicotados pelo adolescente
intransigente, chegando até a sentir pena da família, particularmente da mãe.
À medida que o
filme vai avançando, a seu ritmo vamos tendo novas cenas da vida escolar e
familiar de Makoto que lhe vão possibilitar um enorme crescimento pessoal. Duas
cenas são particularmente marcantes: a cena do jantar, onde o irmão se revela
uma pessoa extremamente preocupada com Makoto e disposta a fazer sacrifícios
pessoais em prol da felicidade do jovem adolescente; e a cena no clube de arte,
que mostra uma redenção de Makoto, tanto perante a jovem que tem um fraquinho
como pela colega de turma esquisita que o admira ao longe. Este é um ponto que
quero dedicar atenção em particular. Como Makoto bem descreve, as pessoas não
são de uma só cor, somos compostos por várias tonalidades e não há nada de
errado com isso. Isso é uma bonita lição, mas como tudo na vida, ao admitir
isso temos de chegar ao passo seguinte e admitir que as pessoas e a realidade
não se reconduzem a uma ou poucas premissas. A família de Makoto, os colegas de
escola, o amigo que, entretanto, o jovem conseguiu fazer, tudo isto vão ser
decisivos para o desfecho final do filme. Mas mais que isso, nós não sabemos o
impacto que temos nas outras pessoas, não necessariamente nas pessoas da
família e de amigos próximos, mas de pessoas que conhecemos por alto ou só de
vista, ou até só das redes sociais. Makoto aprende que toda a sua vida foi alvo
de admiração, pela forma como lidou com o bullying mantendo a postura, pela
família que se preocupa com ele e quer o seu bem apesar dos seus erros, pela
jovem sobre a qual tem um fraquinho. Nós muitas vezes pelo que dizemos,
fazemos, transpomos ou somos, transmitimos uma mensagem à sociedade, que por
vezes é mais profunda e impactante do que pensamos. Mas ao mesmo tempo, e
começo por falar por mim, temos dificuldades tremendas na comunicação. Esse
aliás é um dos motivos pelos quais criei este blog. Comunicar é um ato complicado
e complexo. É mais fácil dito que feito, e Makoto sente isso, até finalmente
conseguir na cena do jantar que falei acima falar claro à família e deixar a
mensagem que lhe vai servir de força para avançar com a sua vida. Será que nós
conseguimos transmitir sempre a mensagem que pretendemos? Aos nossos pais,
avós, irmãos, familiares, amigos, colegas de trabalho, chefias? Provavelmente
não, exatamente porque cada pessoa tem uma tonalidade diferente e temos
dificuldades em compreender uns aos outros. Por esse motivo tinha de falar do
filme no blog.
Deixando de parte os aspetos formais da realização, para os quais outros blogs estão melhor habilitados que eu para discutir, o filme tem uma mensagem forte, sendo um filme focado na visão de adolescente que é uma fase da vida difícil, na qual os problemas de adulto começam aos poucos a surgir (para uns mais depressa que para outros), embora seja um filme que mais facilmente um adulto entende a mensagem. No início deste artigo disse que revi o filme há pouco tempo. É verdade. A primeira vez que o vi foi há uns anos, e tal como disse no artigo da Cartuxa de Parma, na altura não senti a mensagem de Colorful como senti agora. Na altura que vi, achei até um filme desconfortável e em larga medida desagradável. Hoje penso o oposto. Por tocar em temas tão essenciais para a nossa sociedade, desde a saúde mental, a comunicação com os outros, a aceitação do próximo, o crescimento pessoal, são tudo coisas que atingem todas as idades. Por isso não posso deixar de recomendar o filme.
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