domingo, 17 de março de 2024

O Principezinho (versão teatro) - março de 2024 no Parque Mayer (Lisboa)

 



Vou começar este texto com um pequena história: tinha eu 15 anos, estava no início das férias de verão entre o 10º e o 11º ano, e saiu a sequela de um filme da Disney que tinha gostado muito: o Panda do Kung Fu. Por um lado, estava deserto para ver o filme, por outro, no meio daquelas ideias adolescentes e semi paranoia, tinha medo de ser reconhecido a ir ao cinema ver filmes da Disney com aquela idade.

Com o passar dos anos, felizmente, creio que as pessoas tendem a preocupar-se menos com o que os outros pensam e a ser um pouco mais fieis a elas mesmas, ainda que por vezes isso seja muito difícil. O que nos aconteceu ao crescer? Essa, é a pergunta que me fiz imensas vezes enquanto assistia à magnifica interpretação teatral do Principezinho. Num auditório cheio de famílias e crianças de colo, talvez ver lá um adulto solteiro de 28 anos sozinho, possa parecer um pouco estranho. Felizmente para mim, eu não tenho 15 anos, e tudo o que aquela peça me fez sentir merece um artigo no blog.

A peça é uma adaptação do magnifico conto de Antoine de Saint-Exupéry, na minha opinião bastante bem feita. Senti exatamente a mesma experiência que tive quando li o livro pela primeira vez, e honestamente, creio que é um livro que atinge mais um adulto que uma criança. O motivo é muito simples: à medida que o tempo passa, tendemos a esquecer as pequenas coisas que as crianças têm presente, e chega um momento da vida (umas vezes causado por um trauma, outros por necessidade, e muitos pela normal evolução no crescimento) em que sentimos que de um momento para o outro a nossa maneira de pensar mudou, quase como (se me é permitida a metáfora) a voz do consciente que fala connosco tenha mudado. O Principezinho foi uma obra/peça onde voltei a sentir a minha maneira de pensar de criança, e que, em larga medida, sinto saudades. Saint-Exupéry conseguiu fazer isso, algo que não é qualquer filme ou conteúdo infantil consegue, e foi algo que aqueles maravilhosos atores conseguiram transmitir.

Mas falemos também um pouco da história: afinal, o que é que perdemos quando crescemos? Diversas vezes a atriz que interpretava a personagem do Principezinho dizia, após cada planeta visitado que "os adultos são mesmo estranhos". E com razão: perdemos, ao longo do tempo, a criatividade, aquela capacidade de uma criança inventar uma brincadeira ou criar um mundo só com o poder da imaginação. Perdemos a sensibilidade de saber se algo é bonito, e focamos demasiado na etiqueta do preço. Perdemos a capacidade de apreciar as coisas simples da vida. Adquirimos a extrema vaidade, perdemos a racionalidade. E acima de tudo, tornamos os nossos sonhos e objetivos algo de quantificável, em vez de espiritual. Pensemos: uma criança quer ser exploradora? Como é que cresce e descobre que o objetivo dela a partir de agora seja ser, por exemplo, um técnico de contas? Ou um Administrador Financeiro? Para onde foi aquele espírito de curiosidade e aprendizagem?

Outro aspeto que gostei foi o fator criatividade. Com o tempo, ter ideias novas e tentar soluções novas parece cada vez mais difícil, isto porque estamos inseridos num mundo que prega a resignação, e não o espírito crítico. Isso soa familiar? Talvez, porque em larga medida. deixamos de questionar as coisas quando crescemos...

Hoje e sempre, o Principezinho faz-me recordar do que era ser novo, e sentir saudades desses tempos. Numa altura e numa fase da vida em que vivemos constantemente com medo e pessimismo sobre o futuro, o Principezinho faz-nos recordar da inocência da infância e do absurdo que muitas vezes nós os adultos vivemos. Como bem foi escrito e dito no teatro, "as coisas importantes não se vêm com os olhos, mas sentem-se com o coração". E é por isso, que quis hoje, voltar ao blog para falar deste teatro.